Identidade
e fé
Lançado relatório "Indígenas do Brasil
2010", importante estudo sobre presença evangélica nas tribos do país.
Um alentado estudo sobre a situação dos índios brasileiros
acaba de ser apresentado à sociedade nacional. Iniciativa do Departamento de
Assuntos Indígenas da Associação de Missões Transculturais Brasileiras (AMTB),
em parceria c com suas mais de 40 entidades e agências filiadas, o
relatório Indígenas do Brasil 2010 é o mais completo
levantamento do gênero. O trabalho demandou um ano e meio de pesquisas de
campo, coleta de dados, entrevistas e consultas a arquivos de órgãos oficiais e
acadêmicos. O que emerge do relatório são algumas conclusões que contrariam
parte do senso comum acerca do envolvimento da Igreja Evangélica com os povos
indígenas. A principal delas é de que organizações religiosas de linha
protestante prestam inestimável serviço àquelas comunidades, suprindo, muitas
vezes, lacunas deixadas pelo poder público. A outra, não menos importante, é de
que o Evangelho, se apresentado ao indígena da maneira correta, não representa
qualquer atentado à sua cultura. Ou seja, o índio cristão continua sendo índio.
Segundo o estudo, existem no país cerca de 600 mil
indígenas, número bastante superior ao registrado nos anos oitenta, que não
chegava à metade disso. Há presença missionária evangélica em 182 dos 228 povos
oficialmente catalogados. Mais de trinta agências missionárias e quase cem
denominações protestantes históricas e pentecostais têm algum tipo de trabalho
religioso e social entre esses grupos. “O relatório avalia e apresenta
iniciativas, implicações e desafios do movimento evangélico indígena no Brasil
de hoje”, diz o antropólogo e pastor presbiteriano Ronaldo Lidório, coordenador
do estudo. Um dos mais respeitados indigenistas cristãos do país, Lidório tem
larga experiência como missionário no Brasil e no exterior. Ele passou, por
exemplo, uma década entre o povo konkomba, de Gana, na África, e hoje atua com
o Instituto Antropos na Amazônia brasileira.
Valorização cultural – Lidório
faz questão de desmitificara crítica acadêmicaà atuação evangélica em aldeias e
comunidades indígenas. “O índio crente, via de regra, tende a valorizar mais
sua língua e aspectos centrais da sua cultura, o que é bem perceptível na vida
de muitos líderes indígenas evangélicos no Brasil”, destaca. De acordo com o
relatório, há nada menos que 257 programas e projetos de grupos evangélicos
voltados à comunidade indígena. A ênfase é nas áreas de educação (análise
linguística, registro, publicações locais e tradução), saúde, assistência
básica, valorização cultural, promoção da cidadania, saneamento e inclusão
social.
Segundo o missionário, iniciativas de entidades
evangélicas têm ajudado também a gerar consciência sobre problemas que sequer
estavam na pauta nacional, como a questão do infanticídio. Há cinco anos,
missionários foram muito criticados por levarem duas crianças da etnia suruwahá
gravemente doentes para receber tratamento médico especializado. É que, de
acordo com a cultura de diversas tribos, crianças com deficiências físicas
devem ser sacrificadas. “O importante é que o diálogo foi aberto sobre o
assunto e vários indígenas sentiram-se encorajados a tomar posição a favor da
vida”, comenta Ronaldo Lidório. Além disso, acrescenta, a fé é importante fator
de superação de antigas mazelas que afetam os índios, como o alcoolismo e a
prostituição.
O
estudo, disponível no site da AMTB (www.indigena.org.br), mostra que as nações
terena, tikuna, caiuá e wai-wai são algumas das que apresentam maior quantidade
de índios evangélicos. Tal crescimento, claro, demanda a formação de liderança
autóctone, uma das iniciativas do Conselho Nacional de Pastores e Líderes
Evangélicos Indígenas (Conplei). “A liderança da Igreja indígena tem crescido e
ocupado espaços na evangelização, plantio de igrejas e iniciativas sociais, o
que é muito positivo”, frisa Lidório. Ele defende que esse treinamento não seja
somente bíblico, mas integral. “O indígena evangélico lida diariamente com
questões conflitantes que envolvem questões legais e territoriais, diálogo com
a cultura não indígena e assim por diante”, conclui que a ação evangélica entre povos indígenas tem
aspectos religiosos, sociais e culturais.