Pão Diário

Povos Indigenas no Brasil

 Para o período que marca o início do processo de colonização portuguesa, por

ocasião da chegada dos europeus, há estimativas que sugerem que habitavam essa

parte do mundo um significativo contingente populacional indígena, organizado em

várias centenas de grupos sociais distintos. Cinco séculos depois, vivem no território

que hoje está definido como brasileiro, em torno de 220 povos indígenas, falantes de

aproximadamente 170 línguas, ou seja, os remanescentes de hoje constituem uma fração do que já foi uma sociodiversidade indígena bastante expressiva4.

Cada povo indígena apresenta uma configuração particular de costumes, crenças e língua, uma modalidade específica de adaptação a diferentes ecossistemas, uma história distinta de relacionamento com o empreendimento colonial português e com o processo de constituição do Estado nacional brasileiro. E, desse modo, inserem-se de distintas maneiras numa sociedade que se pretende nacional. O reconhecimento étnico se pauta na conjugação de critérios definidos pela consciência da identidade indígena e de pertencimento a um grupo diferenciado dos demais segmentos populacionais brasileiros e pelo reconhecimento por parte dos membros do próprio grupo 5.

3 Ver Oliveira (1999, p. 136): “Não existe uma conceituação explícita dessas categorias, que, no entanto, no Censo 1890 são traduzidas para o idioma francês. Os ‘pardos’ são caracterizados como mestiços (métis), enquanto os ‘caboclos’ seriam

indígenas (indiens)".

4 As estimativas quanto ao número de indígenas que habitavam o que é realmente o território brasileiro em 1500 variam

amplamente, não havendo um consenso. Cunha (1992, p. 14) apresenta uma revisão dessas estimativas, algumas das

quais superam a cifra de 1 milhão de pessoas.

5 Lei nº 6.001, de 19 de dezembro de 1973 (Estatuto do Índio); Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988; e Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho - OIT (Convenção sobre os Povos Indígenas

e Tribais, 1989), adotada em Genebra, em 27 de junho de 1989.

 

Censos Demográficos 1991 e 2000

 

A posse, o usufruto e o controle efetivo da terra pelos índios têm sido reconhecidos

como condição sine qua non para a sobrevivência dos povos indígenas.

A terra é a natureza culturalizada dentro da qual uma etnia realiza suas virtudes e

potencialidades. Um povo indígena sem terras suficientes para exercer seu modo

de ser, se vê forçado a mudar, a deixar de lado muitas características sociais e

culturais que constituem sua etnicidade. No limite, a etnia pode se desagregar em

grupos familiares ou indivíduos desconectados que passam a buscar sua sobrevivência

por conta própria. Havendo a perda da convivência étnica, eventualmente

os indivíduos desagregados perderão as principais condições de manutenção de

sua indianidade.

A garantia do acesso à terra constitui, atualmente, um elemento central da

política indigenista do Estado brasileiro. O processo de demarcação é o meio administrativo para explicitar os limites do território tradicionalmente ocupado pelos povos indígenas, buscando, assim, resgatar uma dívida histórica com esse segmento da população brasileira, propiciar as condições fundamentais para as sobrevivências física e cultural, e preservar a diversidade cultural do País. A ação demarcatória é, portanto, o ato governamental de reconhecimento, visando a precisar a real extensão da posse indígena a fim de assegurar a proteção dos limites demarcados e permitir o encaminhamento da questão fundiária nacional. A demarcação significa, também, a garantia da preservação de um significativo patrimônio biológico do conhecimento milenar detido pelas populações indígenas a respeito desse patrimônio.

O processo administrativo de regularização fundiária, composto pelas etapas de identificação e delimitação, demarcação física, homologação e registro das terras indígenas, está definido na Lei nº 6.001, de 19 de dezembro de 1973 (Estatuto do Índio), e no Decreto nº 1.775, de 8 de janeiro de 1996.

As 604 terras indígenas reconhecidas compreendem 12,5% do território brasileiro (106 359 281 ha), com significativa concentração na Amazônia Legal. Esse processo de demarcação encontra-se ainda em curso, com 70% das terras indígenas regularizadas (demarcadas e homologadas).

 

CRENÇAS

 

A investigação das crenças10 nos censos brasileiros consiste numa única pergunta

“Qual é a sua crença ou culto?”, com a finalidade de conhecer a grande diversidade

de crenças ou cultos declarados pela população do Brasil, como também o número

de adeptos.

É importante frisar que a crença de muitos povos indígenas no Brasil não está

estruturada em igrejas e/ou aparatos com autonomia institucional, o que constitui a

informação mais usualmente captada pelos levantamentos censitários no País.

O que se entende por crença está associado, para os povos indígenas, aos

mitos e lendas, isto é, às narrativas de acontecimentos que explicam o mundo em

que vivem, a posição de seu povo diante dos demais, suas tradições e costumes.

As lendas e mitos, ao descrever e explicar o passado, procuram, como grande parte das práticas crenças, refletir sobre o presente. As lendas e mitos têm uma relação muito estreita com os ritos e com a estrutura social de cada povo. Nas lendas e mitos, são descritas as ações dos heróis místicos, seres transformadores, responsáveis pela criação dos acidentes geográficos, dos animais e plantas.

Nesse sentido, respostas como “sem crença” ou “sem declaração” dos auto declarados

indígenas podem sugerir uma não associação do que é entendido como crença formal. Isto se deve ao fato de que muitas iniciativas missionárias, ao longo de sua atuação junto aos povos indígenas, se opuseram à aceitação de que suas lendas,mitos e crenças tradicionais não constituíam uma religião, com o intuito de convertê-los.

Não obstante, o conhecimento e a contabilização da  da crença população que se autodeclarou indígena é importante, uma vez que se trata de um dos aspectos caracterizadores dos processos de identidade e de transformação sociocultural.

Neste sentido, a investigação da crença  pode auxiliar na compreensão do papel

desempenhado pela atuação dos missionários junto às comunidades indígenas, e

também dos fluxos migratórios para áreas como Norte e Centro-Oeste do País, de

grande concentração indígena, fazendo com que hábitos e costumes fossem sendo

modificados em função do contato desta população com a sociedade nacional. As

influências da crescente urbanização indígena em muitas regiões do País no tocante

à crença também merecem ser investigadas a fundo.

Os resultados da pesquisa das crenças nos Censos Demográficos 1991 e 2000

revelam, quanto aos autodeclarados indígenas, uma população predominantemente

católica, acompanhando a população brasileira como um todo.

A proporção de indígenas católicos apostólicos romanos, em 2000, atinge 58,9%,

contudo inferior àquela declarada em 1991, que é da ordem de 64,3%. Este comportamento de redução no percentual de católicos, apostólicos romanos segue o padrão nacional, o que indicaria que em décadas anteriores a presença das missões tenha influenciado em muito a cultura indígena tradicional. O restante, 41,1% das declarações, apresenta 20% de evangélicos como a segunda grande proporção e 14,4%

10 Pesquisou-se a crença professada pela pessoa. Aquela que não professava qualquer crença foi classificada como sem crença. A criança que não tinha condição de prestar a informação, foi considerada como tendo a crença da mãe.

As crenças foram classificadas nos seguintes grupos: Católica Apostólica Romana, Evangélicas (de missão, de origem pentecostal, outras  evangélicas), Espírita, Espiritualista, Umbanda, Candomblé, Judaica, Budismo, Outras crenças

Orientais, Islâmica, Hinduísta, Tradições Esotéricas, Tradições Indígenas(xamanista), Outras, Sem crença  e não-determinadas que declararam “sem crença”; portanto, dentro dos 6,7% restantes, estariam, além de outras crença (tais como: espíritas, umbanda, candomblé), as chamadas “tradições indígenas”, que representam somente 1,4%. Observa-se, também, na análise comparativa entre os dois censos o crescimento dos evangélicos, principalmente os de origem pentecostal (em 1991, 7,7%, e em 2000, 11,9%), e no conjunto das outras crenças o crescimento dos declarados espíritas, de 0,3%, em 1991 para 0,8% em 2000.

 

Da mesma forma que a estrutura populacional indígena tem características tão

distintas entre a situação urbana e rural do domicílio, a declaração da  crença professada acompanha esta distinção.

 

Quando se analisa a situação do domicílio, a estrutura das crença tem características

próprias. Na área urbana existe uma concentração mais elevada de católicos

apostólicos romanos do que na área rural, e para os evangélicos as proporções são

semelhantes. A diversidade de “outras crença” na área rural é maior do que na

área urbana. Neste grupo, estariam as crença tipicamente de tradições indígenas.

Pelas características da população indígena que habita a área rural, existiria dificuldade na captação das crença dos povos indígenas, o que pode ser constatado pela proporção bem mais elevada de “sem crença” e de “sem declaração”. Estes dois

grupos, somados à categoria “outras crença”, totaliza quase 30%, o que certamente

dificulta as análises.

 

No panorama regional das crença, a menor proporção de católicos apostólicos

romanos foi localizada na Região Centro-Oeste, vindo em seguida a Região

Norte. Estas regiões sempre apresentaram contingentes mais elevados de indígenas,

motivo pelo qual eram e são destinos certos para os missionários. A Região Norte

sempre apresentou taxas de crescimento populacional elevadas e, conseqüentemente,

fluxos migratórios atraídos por uma migração retardatária de fronteira agrícola,

que ao longo das décadas trouxeram seus costumes, culturas e assim firmaram

sua identidade; enquanto que a Região Nordeste apresenta a maior proporção de

indígenas católicos apostólicos romanos, sendo esta região tradicionalmente mais

católica apostólica romana.

De um modo geral, as maiores concentrações de evangélicos para a população

como um todo estão no extremo norte do País, e para os indígenas, excetuando a Região

Nordeste, que apresenta proporção de evangélicos de 12,7%, as demais regiões

oscilaram entre 21,9%, na Região Centro-Oeste, e 22,5%, na Região Sul.

De um modo geral, as maiores concentrações de evangélicos para a população

como um todo estão no extremo norte do País, e para os indígenas, excetuando a Região

Nordeste, que apresenta proporção de evangélicos de 12,7%, as demais regiões

oscilaram entre 21,9%, na Região Centro-Oeste, e 22,5%, na Região Sul.

Quanto à categoria “sem crença”, as maiores proporções foram verificadas nas

Regiões Norte e Centro-Oeste do País, onde se concentram as maiores proporções

de população indígena. As Regiões Nordeste e Sudeste apresentam pro

porções em

torno de 11% e a Região Sul deteve a menor proporção de “sem crença” do País

dentre os indígenas. Este comportamento segue a mesma estrutura observada no

Censo Demográfico 1991.

A distribuição das crenças dos indígenas por situação do domicílio nas regiões

brasileiras revela características especificas, tais como: para os residentes nas áreas

urbanas, de um modo geral, a distribuição percentual das crenças segue a mesma

estrutura em todas as cinco regiões. A proporção de católicos apostólicos romanos

não variou tanto, oscilando entre 59,1% na Região Sudeste e 68,9% na Região Norte.

Já para a religião evangélica, excetuando a Região Norte, as demais mantiveram o

padrão de variação, entre 20,2% na Região Sul e 24,7% na Região Centro-Oeste. Quanto às outras crenças, a Região Norte se destaca com a menor proporção, 2,7%, e para o grupo dos “sem crença” as Regiões Norte e Sul revelam proporções menores e as demais alcançaram 11%.

Para os residentes na área rural, as distribuições foram bem heterogêneas. As

Regiões Norte e Centro-Oeste apresentaram proporções de católicos apostólicos romanos abaixo de 50%, enquanto as proporções de evangélicos e sem crença de ambas as regiões estavam em torno de 22%, caracterizando assim a grande dificuldade de compreensão do que seria crença nestas áreas de elevada proporção de indígenas.

A Região Nordeste apresentou a maior proporção de católicos apostólicos romanos, e a Região Sul a maior proporção de evangélicos.

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